Crescimento da população não ameaça planeta, consumo sim
Demógrafo explica por que não devemos temer uma superpopulação na Terra
por Guilherme Rosa
Em
1798, um economista britânico chamado Thomas Malthus formulou uma
teoria populacional que previa um apocalipse de fome e guerra se a
população humana não parasse de crescer. Sua ideia era que a população
cresceria em progressão geométrica, enquanto nossa capacidade de
produzir alimentos só cresceria em progressão aritmética. Logo, em um
futuro próximo, faltaria comida para alimentar tanta gente.
Hoje, mais de dois séculos depois, a previsão não se confirmou. A população não parou de crescer e estamos todos, bem ou mal, vivos. Mas a teoria malthusiana ainda ressoa entre os mais alarmistas – principalmente agora que estamos atingindo o índice de 7 bilhões de seres humanos. Como dar comida para essa multidão? Como impedir o colapso de nosso já desgastado meio ambiente?
Para responder a essas perguntas, a GALILEU conversou com o demógrafo Roberto Luiz do Carmo, pesquisador do Núcleo de Pesquisas da População (NEPO) da Unicamp. Segundo o pesquisador, os cientistas de hoje não vêm nenhum perigo decorrente de uma superpopulação humana. Nossas modernas técnicas de agricultura garantirão que não falte comida nas próximas décadas – se ainda há fome no mundo, é por que os alimentos são mal distribuídos, e não por causa do excesso de gente. O demógrafo ainda afirma que o que realmente ameaça o planeta é o nível de consumo de nossa sociedade, que já está levando a Terra a seus limites. Veja a entrevista:
Ainda é possível dizer que uma superpopulação humana ameaça o planeta?
Hoje, mais de dois séculos depois, a previsão não se confirmou. A população não parou de crescer e estamos todos, bem ou mal, vivos. Mas a teoria malthusiana ainda ressoa entre os mais alarmistas – principalmente agora que estamos atingindo o índice de 7 bilhões de seres humanos. Como dar comida para essa multidão? Como impedir o colapso de nosso já desgastado meio ambiente?
Para responder a essas perguntas, a GALILEU conversou com o demógrafo Roberto Luiz do Carmo, pesquisador do Núcleo de Pesquisas da População (NEPO) da Unicamp. Segundo o pesquisador, os cientistas de hoje não vêm nenhum perigo decorrente de uma superpopulação humana. Nossas modernas técnicas de agricultura garantirão que não falte comida nas próximas décadas – se ainda há fome no mundo, é por que os alimentos são mal distribuídos, e não por causa do excesso de gente. O demógrafo ainda afirma que o que realmente ameaça o planeta é o nível de consumo de nossa sociedade, que já está levando a Terra a seus limites. Veja a entrevista:
Ainda é possível dizer que uma superpopulação humana ameaça o planeta?
Eu
tomaria muito cuidado na abordagem dessa questão. Não é possível, de
maneira alguma, sustentar uma posição catastrofista em relação ao
crescimento populacional. Não existem elementos científicos para isso. O
argumento malthusiano mostrou-se totalmente equivocado. Ou seja, mesmo
com o crescimento populacional da segunda metade do Século XX, não houve
uma crise significativa na produção de alimentos. Houve, pelo
contrário, um aumento substancial nessa produção. As situações de fome
que afligem muitos países de tempos em tempos, principalmente na África,
derivam da incapacidade de inserção no mercado para compra desses
alimentos. Ou seja, em nível do mercado global, existe uma produção
capaz de atender a população mundial. O que não existe é acesso aos
mercados por parte de alguns países.
Existem estimativas que mostrem o quanto a população humana vai crescer nas próximas décadas?
Existem estimativas que mostrem o quanto a população humana vai crescer nas próximas décadas?
A
ONU faz projeções desse crescimento. [Segundo as mais recentes, teremos
8 bilhões de habitantes em 2025, 9,3 bilhões em 2050 e 10,1 bilhões em
2100.] Essas projeções mostram que a população pode crescer até o final
deste século. Entretanto, elas são revistas a cada dois anos. Nas
revisões recentes pode-se observa dois aspectos importantes. Por um
lado, uma diminuição mais acentuada da queda da fecundidade do que se
previa. Ou seja, transformações sociais importantes como a urbanização
estão começando a agir no sentido de diminuir as taxas de crescimento
populacional em nível mundial. Por outro lado, o efeito da mortalidade
tem sido importante em algumas situações específicas, como no caso da
mortalidade por AIDS no continente africano. Em síntese: existem
oscilações importantes da fecundidade e mortalidade quando se pensa em
nível mundial. Mas observa-se claramente uma tendência de diminuição da
velocidade do crescimento da população mundial. Ou seja, a população vai
continuar crescendo em termos numéricos, mas de maneira cada vez mais
lenta.
E esse crescimento não trará nenhum perigo?
Como já apontei, não acredito que o crescimento populacional seja um problema em si. Concordo com as abordagens de Julian Simon e Esther Boserup, que entendiam a população não como problema, mas como potencial de solução para os problemas, tendo em vista que cada indivíduo possui a principal fonte potencial de mudança, que é o cérebro humano. Nesse sentido, a grande questão é a forma na qual esse crescimento vai acontecer. Ou seja, com que estilo de desenvolvimento? Com que padrão de consumo? Certamente com esse modelo atual o crescimento é inviável.
Existe alguma estimativa que quantos seres humanos o planeta é capaz de carregar sem se exaurir?
Joel
E. Coehn no livro “How Many People Can the Earth Support?”, publicado
pela primeira vez em 1995, já deu a resposta que considero definitiva.
Depois de reconstruir grande parte das avaliações realizadas
historicamente sobre a “capacidade de suporte” do planeta, ele conclui o
livro afirmando: “depende”. Depende do nível de consumo e do tipo de
uso que essa população faça dos recursos ambientais. Em um padrão de
consumo muito baixo, a Terra pode sustentar muito mais do que os 7
bilhões atuais. Ao nível de consumo crescente em que vivemos, com o tipo
de uso que se faz dos bens naturais, creio que já ultrapassamos o
limite. O que sustenta o volume atual da população é, paradoxalmente, a
desigualdade de acesso aos bens e à riqueza que caracteriza a
organização da sociedade atual, com um grande volume de população
vivendo em situações de baixíssimo consumo, e um grupo muito reduzido
(embora crescente) de pessoas com um elevadíssimo padrão de consumo dos
recursos. O grande desafio das próximas décadas é a busca da redução das
desigualdades, sem que isso signifique dilapidação/contaminação dos
recursos naturais. Mas isso exige um outro estilo de desenvolvimento
econômico e social.
Então Malthus estava errado?
Malthus estava totalmente equivocado. Em um exercício muito simples de imaginação basta pensar: se não nascesse mais nenhum ser humano será que os problemas sociais e ambientais estariam resolvidos? Não estou também dizendo que o volume populacional não é importante. É sim fundamental. Mas existem outros aspectos que precisam ser considerados de maneira concomitante quando se analisa a questão populacional, como padrão de consumo e estilo de desenvolvimento.
Então Malthus estava errado?
Malthus estava totalmente equivocado. Em um exercício muito simples de imaginação basta pensar: se não nascesse mais nenhum ser humano será que os problemas sociais e ambientais estariam resolvidos? Não estou também dizendo que o volume populacional não é importante. É sim fundamental. Mas existem outros aspectos que precisam ser considerados de maneira concomitante quando se analisa a questão populacional, como padrão de consumo e estilo de desenvolvimento.
Fonte: http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI291017-17770,00-CRESCIMENTO+DA+POPULACAO+NAO+AMEACA+PLANETA+CONSUMO+SIM.html
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